
A luta pela Reforma Obstétrica recebeu apoio dos participantes 14º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva (Abrascão). Congressistas do 14º Abrascão — que reúne pesquisadores, sanitaristas, gestores, profissionais de Saúde e movimentos sociais — declararam apoio à luta das mulheres e da Enfermagem.
Destacando as altas taxas de cesarianas, prematuridade e de mortalidade materno-infantil, o documento, aberto a adesão dos congressistas, pede a criação de grupo de trabalho na Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e de um Grupo de Trabalho Interministerial, coordenado pelo Ministério da Saúde, para a elaboração e implementação da Reforma Obstétrica no Brasil, com efetiva participação da sociedade civil. O 14º Abrascão, realizado em Brasília pela Abrasco e Fiocruz, busca articular produção científica, formulação de políticas e mobilização social.
“O dimensionamento defendido na moção é o ideal, de 1:1, ou seja, uma enfermeira obstétrica ou obstetriz para cada paturiente. Isso poderia revolucionar a assistência ao parto. Com uma parturiente, a enfermeira obstétrica pode realizar todo monitoramento e acompanhamento humanizado. A gente deve evitar intervir, mas o parto precisa de monitoramento constante”, explica enfermeira obstétrica Tatiana Melo, chefe do Departamento de Gestão do Exercício Profissional (DGEP/Cofen).
O investimento em profissionais de Enfermagem obstétrica tem o potencial de salvar 4,3 milhões de vidas por ano até 2035, segundo estimativa do Relatório Mundial da Obstetrícia do Fundo de Populações das Nações Unidas (UNFPA/ONU). “O movimento da Reforma Obstétrica surge pela dificuldade de baixar as taxas de mortalidade materna, neste modelo de assistência médico-centrada, marcado pelo intervencionismo. A Reforma Obstétrica propõe uma assistência centrada na fisiologia do parto, nas boas práticas científicas e no trabalho multiprofissional”, explica Tatiana.

O manifesto Reforma Obstétrica no Brasil Já, lançado em abril, reflete um amplo consenso sobre a necessidade de mudanças no modelo assistencial. A proposta foi elaborada com entidades comprometidas com a vida das mulheres, incluindo a Rede Nacional Feminista de Saúde, Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos, e Rede pela Humanização do Parto e Nascimento (REHUNA), com apoio de 27 instituições, entre elas o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), a Associação Brasileira de Enfermagem (Aben) e a Associação Brasileira de Enfermagem Obstétrica (Abenfo).
“Não é apenas uma proposta técnica. É um compromisso político. É dizer: nenhuma mulher deve morrer ao dar à luz. É enfrentar o racismo estrutural que atravessa a saúde pública. É garantir que as mulheres negras, indígenas, periféricas e do campo não sejam invisibilizadas no momento mais delicado de suas vidas”, afirma da deputada federal e enfermeira obstétrica Ana Paula Lima (SC), que apresentou a proposta ao ministro.
Moção de apoio à Reforma Obstétrica – Proposta por congressistas do 14º Abrascão
Considerando no Brasil:
• A crescente e elevada taxa de cesariana (60% em 2024);
• A crescente e elevada taxa de prematuridade (12,3% em 2024);
• A Razão de Mortalidade Materna e o Coeficiente de Mortalidade Infantil e Neonatal elevados e estagnados;
• A maior vulnerabilização de meninas, adolescentes, das mulheres indígenas e negras,
outras pessoas que gestam, pessoas em situação de rua, privadas de liberdade e outras;
• Os impactos da crise climática e da migração na saúde sexual e reprodutiva, materna, fetal e infantil
• A grave situação da pobreza menstrual no Brasil como violação de direitos sexuais e reprodutivos;
• A fragilidade de políticas de planejamento reprodutivo, contracepção e aborto seguro;
• Os desafios para a qualificação da atenção pré-natal e puerpério;
• A persistência de um modelo de atenção ao parto e nascimento obsoleto, médico-centrado,
hospitalocêntrico e hipermedicalizado;
• Os efeitos iatrogênicos imediatos, de médio e longo prazo desse modelo sobre a saúde das mulheres,
das crianças e na vida adulta;
• A insuficiência de ações de comunicação, educação e mobilização social sobre o parto normal como
forma de promoção e proteção da saúde materna e infantil;
Considerando que a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO) é a entidade que reúne a maior capacidade de aglutinação social e enfrentamento de problemas de relevância em saúde pública no país;
Considerando que a Reforma Obstétrica no Brasil é urgente e fundamental para o enfrentamento da mortalidade materna, fetal e infantil evitáveis e para a eliminação da violência e do racismo obstétrico e neonatal – temas essenciais e prioritários para a saúde pública brasileira;
Nós, participantes do 14º Congresso Brasileiro de Saúde Coletiva da ABRASCO vimos manifestar nossa defesa e apoio à proposta da Reforma Obstétrica Brasileira, que tem como objetivos:
– A implementação de um modelo de atenção obstétrica que valorize a saúde, a dignidade, o protagonismo e os direitos das mulheres, pessoas que gestam e das crianças;
– A qualificação da atenção ao parto, ao aborto legal e ao nascimento no Brasil a partir das evidências científicas e recomendações de organismos internacionais como a Organização Mundial de Saúde (OMS), o Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP) e a Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO), além das diretrizes nacionais de assistência ao parto e da cirurgia cesariana e tendo como base os direitos humanos de mulheres e crianças e os direitos sexuais e reprodutivos;
– O fortalecimento da Rede Alyne com ênfase na integração e continuidade entre a assistência pré-natal, o cuidado ao parto e pós-parto e ao neonato;
– O fortalecimento da atuação da enfermagem obstétrica (EO) e obstetrizes na atenção ao parto e ao nascimento de risco habitual para a promoção da fisiologia, assegurando o cuidado 1:1 ou seja, uma EO/obstetriz para cada parturiente, além da assistência ao aborto legal e no planejamento reprodutivo. O cuidado deve ser realizado em equipe interprofissional, com participação de doulas e integrado à rede de atenção à saúde;
– O investimento na formação e suficiência quantitativa (estimativa de necessidade de cerca de 130 mil enfermeiras obstetras e obstetrizes, quando o cenário atual é de 13.000), com planejamento de condições que assegurem sua inserção e atuação autônoma nos serviços de saúde;
A participação das Doulas no apoio às parturientes como evidência científica e direito;
A promoção do parto normal digno e respeitoso para a redução das taxas de cesarianas no país, lembrando que o Brasil ocupa a vergonhosa marca de campeão mundial de nascimentos pela via cirúrgica;
A implementação da legislação disponível no país para o funcionamento de maternidades segundo as normas da ANVISA e de segurança da paciente;
A efetiva e inadiável redução da morbimortalidade materna e neonatal.
Reivindicamos o apoio institucional da ABRASCO para:
– Estruturar grupo de trabalho no âmbito da ABRASCO para elaborar e desenvolver a proposta da Reforma Obstétrica no Brasil, incluindo o fomento à pesquisa na área
– Articular a criação de um Grupo de Trabalho Interministerial coordenado pelo Ministério da Saúde para a elaboração, implantação e implementação da Reforma Obstétrica no Brasil, com efetiva participação da sociedade civil.
Fonte: Ascom/Cofen – Clara Fagundes


