Por Jade Abreu
Às 8h, a psiquiatra Kyola Vale, 58 anos, abre a porta do ambulatório no Hospital Materno Infantil de Brasília (Hmib), organiza as bandeiras das comunidades LGBT e trans, liga o computador e se prepara para um novo dia de serviço. Naquela manhã, atenderá mulheres vítimas de violência, com gravidez indesejada, idosas, população LGBTQIA+, com enfoque principal na comunidade trans, e autistas.
Há 15 anos, ela dedica-se a pautas com populações vulneráveis. Neste ano, a médica da saúde mental recebeu o prêmio Marielle Franco, concedido pela Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), como servidora ativista pelos direitos humanos. “Esse ativismo é minha vida. É uma galera que precisa muito e tenho o privilégio de atuar como médica”, conta.
Nas horas vagas, Kyola faz trabalho voluntário no sistema socioeducativo para jovens. “Eu me importo com as pessoas porque não são coisas, são sujeitos de direito, e tenho o prazer de conhecer cada mundo e caminhar junto”, destaca a profissional. Alguns relatos de casos pessoais e profissionais são publicados no blog A estética do sofrimento.
Paciente da psiquiatra desde 2017, o auxiliar administrativo do CNPq João Roberto dos Reis de Souza, 26 anos, relata que a médica busca compreender as diferenças nas relações de classe, raça e gênero. “No meu caso, que sou homem trans, ela sempre me tratou com os pronomes corretos e isso faz com que eu não evada do tratamento”, afirma o paciente.
“O atendimento inadequado gera constrangimento, dor e evasão, por isso é importante ter pessoas atuando no Estado que sejam capazes de compreender e lidar com essas demandas”, defende João Roberto. Ele foi encaminhado ao atendimento para o Hmib, após dar entrada no Hospital Universitário de Brasília.
Pelo fato de Kyola Vale ser reconhecida na rede pelo atendimento à comunidade trans, a educadora social Rubi Martins dos Santos Correia, 34 anos, também foi encaminhada para acompanhamento com a psiquiatra. Ela procurou apoio no Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), devido à ansiedade. “Sou mulher trans, e o respeito pelas identidades de gênero e sexualidade é primordial em qualquer atendimento, principalmente na área da saúde mental”, ressalta a educadora.
O Prêmio Marielle Franco de Direitos Humanos está na terceira edição. A premiação reconhece a atuação de defensores dos direitos humanos em diversas áreas. Além de prestigiar os selecionados, o reconhecimento contribui para que mais pessoas, organizações e servidores engajem-se nessa defesa.